@giovanaeribeiro
TEMAS MÉDICOS
Pornografia faz mal?
On 10 Mar, 2025
Você já parou pra pensar que quando o assunto é sexo, nossas atitudes e desejos são constantemente moldados pela pornografia? Sim. Nós somos uma sociedade onde a pornografia consegue definir o padrão para nossa sexualidade e nossos relacionamentos, antes mesmo que tenhamos a oportunidade de explorar e descobrir essas coisas incríveis por nós mesmos. Os pornôs são os professores sexuais número um para muita gente. E se for esse o caso, fica a pergunta: qual é o currículo que esse professor usa?
Em 2012, Natalia Purcell, pesquisadora e socióloga da Universidade da Califórnia, fez uma análise de 100 dos 250 mais vendidos filmes pornôs dos últimos anos. Ela relatou que cenas de agressão e abuso estão presentes em quase todos os filmes, e que, desde os anos 70, a pornografia veio se tornando incrivelmente mais agressiva e humilhante do que era antes, e já no período final do estudo (próximo dos anos 2000), atos como “ATM”, gagging, penetração dupla e estrangulamento também apareceram em quase todos os filmes. “ATM" é o ato conhecido como “ass to mouth”, significando que o pênis primeiro penetrará no ânus e depois na boca. "Gagging" representa o ato onde o pênis vai tão fundo na garganta do parceiro ou parceira, que basicamente ativa o reflexo de engasgo até ele ou ela sentir falta de ar.
Outro estudo interessante, realizado em 2005 por Anna Bridget, estudou 50 dos 275 mais bem vendidos filmes pornôs dos EUA, durante o período de dezembro de 2004 até junho de 2005. Depois, dentre esses, foram selecionadas aleatoriamente 304 cenas e os achados foram: 9 de 10 cenas continham agressão física. Agressão física foi definida primariamente como gagging, bater, puxões de cabelo, entre outras coisas. Cinco de dez cenas continham agressão verbal, a qual foi definida principalmente como xingamentos, onde os nomes mais comumente usados eram vadi* e vagabun**. A maioria das pessoas que foram expostas a esse tipo de agressão eram mulheres e imagina qual era a reação delas? Quase todas as mulheres reagiram positivamente ou de forma neutra às agressões e quase nunca tiveram uma reação negativa. Vamos aplicar isso na vida real? Se você levasse um tapa no seu rosto agora, talvez você não ficaria tão feliz com a pessoa que lhe bateu, certo? Mas, na pornografia, a resposta típica a agressão costuma ser exatamente o oposto do que é esperado na vida real. Na vida real, você ficaria bravo(a) por ter apanhado, mas se a vida fosse como na pornografia, você permaneceria neutro(a) ou até pediria baterem mais em você. Que pressão, quais normas e quais padrões criamos com isso? Como a pornografia afeta a nossa vida sexual?
Homens assistem mais pornografia do que mulheres. Uma pesquisa online feita pela BBC de três séries, chamada 'Porn Laid Bare', perguntou para mais de 1.000 pessoas de 18 a 25 anos na Grã-Bretanha sobre seu relacionamento com a pornografia. Um número significativo de 77% dos homens admitiu ter assistido a conteúdo pornográfico no último mês, em comparação com 49% das mulheres e 55% dos homens disseram que a pornografia foi sua principal fonte de educação sexual, em comparação com 34% das mulheres. 15% dos entrevistados do sexo masculino acharam que assistiram a muita pornografia, e 31% sentiram que talvez poderiam ser viciados nela.
Logo, um dos principais moderadores do impacto da pornografia na psique pode ser o gênero. Como homens e mulheres temos preferências e papeis de gênero diferentes (sejam impostos ou não), tendemos a interpretar, internalizar e aplicar diferentes roteiros sexuais. Para dar um exemplo concreto, homens podem ser movidos por diretrizes sexuais específicas da pornografia, como cortar as preliminares ou pressionar a cabeça da parceira(o) para penetrar exageradamente no sexo oral. Ou seja, devido aos "ensinamentos" da pornografia, homens tendem a ter atitudes que podem, por sua vez, levar à insensibilidade sexual e à erosão da intimidade de um relacionamento.
Vários estudos relataram que homens que usam pornografia também são mais propensos a se sentirem decepcionados com a falta

de desejo de suas parceiras (ou parceiros) em realizar tais atos sexuais retratados no pornô, tendendo a levar a uma atração sexual reduzida pela parceira(o), sexo que não atende às expectativas e sentimentos de inadequação sexual que podem causar disfunção erétil. Ejaculação retardada também pode estar associada ao uso excessivo de pornografia, possivelmente por conta da masturbação frequente e à diferença significativa entre a realidade do sexo com um parceiro(a) de verdade e a fantasia sexual relacionada à pornografia que é criada durante a masturbação. Maior frequência do uso de pornografia também tende aumentar a insatisfação com o tamanho do pênis entre os homens. No geral, homens que usam pornografia com mais frequência tendem a relatar menos satisfação com sua vida sexual, diminuição da libido ou outros sintomas de disfunção sexual. Quando se trata de saúde sexual, há uma preocupação crescente sobre como o aumento do acesso à pornografia online pode afetar o desenvolvimento sexual, a sua função sexual, os relacionamentos íntimos e a saúde mental, principalmente de homens e adolescentes. Pesquisas revelam que cada vez mais jovens estão usando a pornografia como uma forma de educação sexual e implementando as práticas vistas em sua experiência sexual. Muitos homens acreditam que os vídeos e filmes pornôs são importantes meios para provar sua masculinidade e para aprender a como satisfazer suas parceiras (ops, vocês foram enganados pessoal!).
Em relação as mulheres, diversas literaturas expressam o impacto na saúde mental por conta da pressão sofrida para praticar sexo anal (que aparece em 15% a 32% das cenas pornográficas) e outras cenas indesejadas por elas no ato sexual com seu parceiro. É possível concluir que padrões irreais de “feminino e masculino” que são disseminados pela indústria pornográfica e causam algumas expectativas, criam complexos e intensificam a baixa autoestima tanto de mulheres quanto de homens. O uso de pornografia estava associado a maiores preocupações com o desempenho sexual, presumivelmente porque estabelece padrões inatingíveis de comparação sexual tanto para homens quanto para mulheres - não durando tanto quanto os atores (para os homens) e não experimentando um orgasmo tão facilmente quanto as atrizes (para as mulheres).
O uso frequente de pornografia cria crenças irreais sobre a sexualidade e representa uma ameaça à autoconfiança sexual, principalmente para os homens. Autores argumentam que a pornografia é uma das causas principais do aumento de uma série de disfunções sexuais e da perda de desejo por parceiros ou parceiras reais.
Agora, imagine se fôssemos uma sociedade baseada na saúde sexual, onde podemos explorar e ser sinceros e sinceras para decidir e descobrir sobre o que queremos, o que achamos sexy e o que nos excita. Soa muito mais agradável não é mesmo? imagine se todo esse cenário fosse diferente. Imagine o quão incrível seria se fôssemos capazes de descobrir e criar a nossa própria sexualidade, por nós mesmos? O quão incrível seríamos se fôssemos curiosas e curiosos sobre os nossos gostos, sem nos limitar por padrões impostos pela indústria pornográfica ou classificação de gêneros. O que você pensa que é sexy e o que te excita? Mas, para chegar lá é importantíssimo pensar qual o papel da pornografia na sua vida sexual e como isso afeta a sua vida. Afinal, o que é um bom sexo pra você?
Por Giovana E. Ribeiro